27 de julho de 2008

Fonte: Rodrigo Mendes
Nevascas fora de época foram registradas neste ano nas Montanhas Rochosas
















AQUECIMENTO GLOBAL

Um pouco de aquecimento seria bom, afirmam céticos

Cientistas contrários ao IPCC dizem que a Terra se prepara para um esfriamento global, o que pode ser pior que os efeitos do aumento da temperatura no planeta.

A pauta do momento é o aquecimento global. Há cientistas que dizem que a Terra está aquecendo e os que afirmam o contrário. Seja como for, a tese mais comumente aceita é a primeira. Se isso é verdade, existe algo de bom nisso? Os que se posicionam de modo contrário a essa tese dizem que sim, mas para eles o planeta está esfriando.

Essa é a opinião do cientista político Bjorn Lomborg. Para o sueco, professor da Escola de Administração de Copenhagen, que também se engajou no movimento ambientalista e escreveu livros sobre o assunto, é inútil combater o aquecimento. Em entrevista concedida ao jornal "O Estado de São Paulo", em março deste ano, ele afirmou que o dinheiro previsto para projetos contra o aquecimento deve ser gasto para sanar o problema da fome no mundo. Contudo, reconhece a importância dessa crença em um aquecimento, pois políticas públicas incentivaram o investimento em fontes de energia alternativas.

Ao questionar o climatologista português Rui Moura, muito mais cético que Lomborg, a resposta em relação a um hipotético aquecimento é bem mais incisiva: “Para o Homem um cenário de aquecimento é nitidamente preferível ao de arrefecimento”. Ele explica que, no Período Quente Medieval (1000-1300) houve abundância nas safras de cereais. Os camponeses europeus enriqueceram e migraram para as cidades. Moura também ressalta o vigoroso crescimento das cidades, que contavam com uma mão-de-obra abundante.

Nesse período foram construídas as pontes e as catedrais góticas. Os vikings colonizaram a Groenlândia, onde produziam cereais em quantidade suficiente para manter uma colônia florescente. Os árabes subiram até ao norte da Península Ibérica para ocupá-la; os ingleses cultivavam vinho nas terras ao norte, próximo à fronteira com a Escócia.

Na Alemanha, alguns séculos depois, a economia vive um momento de prosperidade parecido, graças às ações que visam o combate ao aquecimento. As usinas de energia eólicas estão entre os maiores empregadores de mão-de-obra do país. Isso é reflexo direto das metas estabelecidas pelo governo, cujo objetivo é atingir a ambiciosa meta de ter 12,5% de sua matriz energética proveniente de fontes renováveis de energia até 2010. Cerca de 170 mil pessoas trabalham no setor e estima-se a criação de mais 100 mil vagas até o ano 2020.

Esse é o mesmo panorama de outros países europeus, tais como a Inglaterra e a Holanda. Neste último, uma empresa fabricante de eletroeletrônicos prevê a venda de 325 milhões de lâmpadas fluorescentes, número cinco vezes maior do que tudo que foi vendido em 2001, quando começou uma campanha contra as lâmpadas incandescentes, que duram menos e consomem mais energia.

E no Brasil os bons efeitos do aquecimento também se fazem sentir. A venda de eletrodomésticos é movida por aparelhos que consumam menos energia, os carros que convertem o motor para GNV (Gás Natural Veicular) pagam menos impostos e a negociação de créditos de carbono já chegou à bolsa de valores de São Paulo, a Bovespa.

Contudo, segundo Moura, essa euforia provocada pelo suposto aquecimento deve acabar logo. Isso porque depois da era de aquecimento já descrita, seguiu-se um período frio conhecido pela Pequena Idade do Gelo (1300-1850). Isso foi uma catástrofe, pois a fome se alastrou devido às colheitas destruídas.

Os vikings abandonaram a Groenlândia e dirigiram-se para o continente americano. Os que ficaram não quiseram adotar um modo de vida tipo esquimó e preferiram morrer como cristãos. De acordo com o cientista português, existem ruínas de igrejas cristãs groenlandesas. Durante as fases de tempo quente a humanidade multiplica-se. Durante as fases de tempo frio retrocede. “Os malthusianos sabem disso”, dispara.

Vale a pena discutir sobre aquecimento ou não aquecimento?

Para Wilson da Costa Bueno, presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Científico (ABJC), é muito importante debater sobre o assunto. “O aquecimento global é uma pauta fundamental, mesmo porque há elementos para comprovar a dramaticidade do problema. Reconheço que a imprensa, em geral, age de maneira sensacionalista e, com raras exceções, não está na prática efetivamente comprometida com o debate”, pensa.

Para Bueno, a cobertura é mais consistente nas mídias ambientais e nas falas de algumas ONGs da área. Lembra que há também muitos oportunistas (políticos, empresários, executivos de empresas predadoras e mesmo jornalistas que fazem o jogo do marketing verde) que estão chegando agora, tentando ver se participam deste banquete informativo.

“Acho que o tema merece cobertura, mas que ela deveria ser mais qualificada. Falta compromisso, falta informação e falta vergonha na cara para muitos coleguinhas. Felizmente, há ainda gente séria”, conclui.

Mais do que garotas de biquíni na praia, ou tomar um bom sorvete numa tarde quente, o aquecimento global já conseguiu provocar um debate sobre o assunto, ainda que não seja tão bom, como afirma Bueno.

Causas do fenômeno provocam divisão entre cientistas

No ano passado o ex-vice-presidente dos EUA, Al Gore, recebeu o Prêmio Nobel da Paz juntamente com os membros do IPCC, sigla em inglês para Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, órgão da ONU que elaborou um relatório sobre o clima, apresentado em fevereiro de 2007. Contudo, eles não são uma unanimidade para outros cientistas. As causas do aquecimento global são o maior ponto de divergência entre o primeiro e o segundo grupo.

Os cientistas do IPCC e o cineasta norte-americano Al Gore dividiram um prêmio de US$ 1,5 milhão, o equivalente a quase R$ 3 milhões. O Prêmio Nobel da Paz, entregue na cidade de Oslo, Noruega costuma contemplar pessoas ou grupos que contribuam de algum modo para a manutenção da paz mundial. Al Gore foi um dos indicados por ter produzido o filme “Uma verdade inconveniente”.

O grupo que discorda dos primeiros alega que os relatórios apresentados pelo comitê não devem ser tomados como definitivos, o que justificaria a revisão dos investimentos feitos nas atuais pesquisas sobre o tema. Quanto ao ex-presidente dos EUA, sua alegação é de que não passa de um oportunista. Para Rui Moura, a decisão do Supremo Tribunal de Londres, que apontou nove erros no documentário de Al Gore apenas um dia após a entrega do prêmio, não poderia vir em momento melhor.

“É a coroação de uma mentira climática”, referindo-se à entrega do Nobel da Paz. “O júri que atribuiu o prêmio não deve entender ciência e, muito menos, climatologia. O Supremo Tribunal de Londres reconheceu existirem nove erros no principal trabalho de Al Gore que, por sua vez, repete a cartilha do IPCC”, diz. Autor do blog “Mitos Climáticos”, Moura é um dos que reclamam um maior espaço nos veículos de comunicação especializados no assunto.

Ele diz que a Terra é como o interior de uma geladeira, que existe uma troca constante de temperaturas e por isso não se pode falar em mudanças globais. “Qual é o significado físico da designada temperatura média global? Se alguém tiver a idéia de determinar matematicamente a temperatura média do Brasil e de Portugal, o valor obtido define o clima do Brasil e de Portugal? Não, como é óbvio”.

Moura se refere ao modo como os cálculos do aquecimento global são realizados, por meio de modelos matemáticos. “A designada temperatura média global tem um significado estatístico. Não tem qualquer significado físico dentro do campo das temperaturas. Representa as trocas meridionais de massas de ar e de energia entre os pólos e os Trópicos. Quando o valor é elevado significa uma intensificação dessas trocas. Como é hoje.

Para ele, a troca não pode tender para infinito, por isso a designada temperatura média global passa por um máximo e depois desce. É o que ele chama de “ciclo natural do clima”. “Dentro de uma a duas dezenas de anos vai descer em ambos os hemisférios. Sim, porque no Hemisfério Sul existe indícios que apontam já para essa descida”, aponta Moura.

Barrado no IPCC, cético admite crescimento dos empregos

Outro excluído é o norte-americano Richard Lindzen. O climatologista do Instituto de Tecnologia de Massachussets afirma haver muitos cientistas respeitados que, por discordarem do IPCC, foram duramente censurados e tiveram o financiamento para novas pesquisas suspensos por seus respectivos governos. Mesmo antes que o Painel divulgasse os dados apresentados neste ano, Lindzen, que já integrou o Painel da ONU, denunciou o que poderia acontecer no artigo “Clima de Medo”, escrito em abril de 2006.

“Levantando a questão sob o ponto de vista político, os que liberam recursos para pesquisas vão acabar provocando ainda mais alarme e aumentar a dimensão política da questão. Quem se interessará em pôr dinheiro na ciência – para a AIDS, ou o espaço, ou o clima – se não há nada que realmente alarme?”, questiona.

Ele reconhece, porém, que o aquecimento global aqueceu o mercado e gerou muitos empregos por causa das políticas públicas executadas. “Certamente, o sucesso do alarmismo em torno do clima pode ser contabilizado pelas despesas federais em pesquisas que eram de algumas centenas de milhões de dólares antes de 1990 e hoje alcançam 1,7 bilhão.

Pode ser constatado também pelos crescentes gastos em energias limpas como solar, eólica, hidrogênio, álcool, etc.”Por outro lado, um dos nove brasileiros que participaram da elaboração do documento sobre o clima apresentado pelo IPCC, Odo Primavesi, que é engenheiro agrônomo e pesquisador da Embrapa, diz que existe certa colaboração de Al Gore, pois ao menos propagou ao mundo a importância do cuidado com o clima.

“Al Gore merece o prêmio pelo esforço realizado”, afirma Primavesi.Ele rebate as críticas e afirma existir uma posição parcial do IPCC em relação às causas do aquecimento global. “O relatório do IPCC procura esmiuçar de forma esmerada a visão dos gases de efeito estufa. Mas em nenhum momento toca no aspecto do que gera o calor que vai ser retido e refletido por esse cobertor de gases que envolve a Terra”, defende. “Os cientistas constataram um fato. Mas as ações dependem de políticas e de boa vontade da população consumidora. Os políticos ainda não se convenceram, e são forçados por lobbies de que teriam prejuízos econômicos”.

Pontos em comum, até certo ponto

Apesar da não concordância entre os dois grupos de cientistas, eles concordam em pelo menos dois fatos: que a temperatura média global aumentou desde o final do século XIX; e, que os níveis de dióxido de carbono na atmosfera aumentaram 30% no mesmo período. Mas as maneiras de explicar as afirmações acima tomam caminhos totalmente distintos.

Em relação às causas da mudança de clima, o relatório do IPCC afirma que é "muito provável" (até 90% de chance) que as atividades humanas, lideradas pela queima de combustível fóssil, estejam fazendo a atmosfera esquentar desde meados do século passado. Contudo, o próprio Ministério do Meio Ambiente brasileiro tem recomendado cautela com relação aos resultados, preferindo tomá-los como indicadores, postura adotada pelo pesquisador da Embrapa.

Primavesi lembra que o aquecimento global não é constituído apenas por gases, mas também pela falta de áreas verdes, que faz aparecerem as “ilhas de calor”. Lindzen, por sua vez, não atribui as catástrofes naturais do último século a uma suposta ação humana e que não são apenas os homens os emissores de gases, pois eles são fartamente encontrados na natureza. Moura explica as diferenças de temperatura como um ajuste natural do planeta, como se fosse imensa geladeira, com o congelador nos pólos. Para ele, as diferenças de temperatura são resultado de um esforço natural da Terra.

Também discordam quanto à eficiência do uso dos modelos, programas de computador preparados para simular situações climáticas. Enquanto o primeiro grupo confia em seus dados, o segundo questiona-os duramente. Um exemplo de estudo realizado a partir dos modelos é o que foi publicado recentemente pela Nature, fortemente rebatido pelos não céticos. De acordo com a revista, a atividade humana é responsável não apenas pelo aquecimento global, mas também pelo aumento da umidade do ar.

O fato é que em nenhuma parte da matéria havia espaço para outras opiniões. Com tantas vozes diferentes apregoando sobre o mesmo tema, fica difícil entender o que move cada pensamento. Há explicações plausíveis dos dois lados; razão pela qual deve haver espaço para ambas correntes teóricas.

Avaliação científica influencia políticas de investimento
Governos investem em novas pesquisas: orientados pelas decisões de especialistas

Por causa das alterações climáticas geradas pelo aquecimento global, cientistas ligados à área de Ciência & Tecnologia buscam novas alternativas para que a sociedade moderna continue sua evolução, sem aumentar os prejuízos ao ambiente. Diferentemente do que se possa supor, a temática é debatida entre governantes e cientistas desde fins da década de 80, e esse foi o ponto inicial para a criação do protocolo de Kyoto.

O protocolo visa diminuir em 5,2% dos gases poluentes, percentual referente ao ano de 1990, e essa meta deve ser alcançada entre 2008 a 2012, porém, avanços deveriam ter sido apresentados em 2005. Para se tornar vigente é necessária a ratificação por, no mínimo, 55 países, a fim de contabilizar 55% da emissão de gás carbônico produzido pelos países industrializados.

O relatório não exige a participação de países em desenvolvimento porque não são os maiores poluentes globais, como é o caso do Brasil, que utiliza energia limpa proveniente das hidrelétricas, contudo, sua maior fonte de poluição são as queimadas, que geralmente ocorrem para limpar o canavial. Dessa maneira não é preciso investir em maquinário e, por conseguinte, em trabalhadores especializados.

Devido ao aquecimento global, surge a problemática de se promover o desenvolvimento sustentável, que implica no fato de que os recursos utilizados pela atual geração sejam desfrutados pelas gerações futuras. Por exemplo, há as novas tecnologias para celulares, mas sem uma política ampla para o descarte das baterias toda a futura geração encontrará sérias dificuldades para trabalhar a questão do lixo.

Outro exemplo é o petróleo, maior fonte de energia não-renovável no mundo, também conhecido como energia suja. Essa fonte de energia foi usada em demasia, se esgotará, é poluente e um dos prováveis causadores do aquecimento global. Para o Economista e doutor em administração de empresas pela Faculdade Getúlio Vargas, Pedro Ramos, o desenvolvimento sustentável, “cujo tripé engloba os objetivos ‘ambientalmente correto, socialmente justo e econômico’, com enfoque principal neste último, até agora é mito, pois não houve grandes feitos para colocá-lo em prática. É preciso haver um equilíbrio entre os objetivos, sem privilegiar apenas um”.

O biocombustível surge como uma alternativa para apaziguar o problema, uma vez que é energia limpa (grau poluente menor) e renovável. Conforme explica o Doutor em Ciência e Engenharia de Materiais pela Universidade de São Paulo (USP), Bill Jorge Costa, os biocombustíveis derivam de todos os óleos vegetais, gorduras animais e resíduos da biomassa, que contêm ácidos graxos e, ainda, existem outros resíduos que podem ser transformados nessa energia limpa. “Ainda não temos clareza qual apresenta maior benefício ou menor risco, mas certamente a escolha da matéria-prima está fortemente atrelada à sua produtividade, custo de produção e aproveitamento integrado dos co-produtos gerados”, conclui.

Por depender de matéria-prima como a cana-de-açúcar, subsídio mais usado no Brasil, existem questões sobre como a produção em larga escala afetará o solo por causa da prática da monocultura. Terras férteis serão supostamente desapropriadas para a plantação de matérias orgânicas que originam o biocombustível, tais como soja e mamona, ou seja, são necessárias diretrizes que definam locais e o modo como o combustível será feito.

Por sua vez, os países do hemisfério sul são os menos poluentes e os mais ricos em solos para o cultivo das matrizes energéticas, entretanto, tal fonte de energia seria, na teoria, voltada para utilização em automóveis, uma vez que o Brasil já usa energia limpa em suas indústrias, e o uso do petróleo é, em grande parte, destinado a automóveis. Com o surgimento dos carros com motor Flex, diminuiu-se o uso da gasolina (energia suja).

Este ano o presidente norte-americano George Bush veio ao país a fim de se reunir com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para debater a exportação do etanol, pois nos Estados Unidos a matriz energética é obtida por meio de grãos, como o milho, e não é tão eficaz como a obtida na cana. Contudo, o petróleo, mesmo que em menor quantidade, ainda será usado pelas indústrias dos países desenvolvidos, uma vez que os biocombustíveis ainda não têm a potência necessária para atender a demanda das grandes indústrias, de maneira que a produção não seja afetada.

17 de julho de 2008

Guardiões da tradição




Orquestra de Viola lança novo DVD

Texto e fotos: Alex de Souza
O percussionista Escurinho, programa “Viola minha Viola”, gravou o DVD com a orquestra

Se a maior qualidade de um caipira é a simplicidade, a Orquestra Paulistana de Viola Caipira (OPVC) está bem longe disso. Não por seus integrantes – muito simpáticos e achegados – mas por sua música. De fato, formam uma orquestra, pois a complexidade de se tocar viola (aquela com 10 cordas, distribuídas em cinco pares) ao lado de outros 50 violeiros exige uma coordenação e sincronia que além da capacidade dos seres comuns.
Difícil também se torna a tarefa de descrever a aura que um ensaio da OPVC contém. Ao conversar com o maestro Rui Torneze, a frente da orquestra há mais de 11 anos, era possível ouvir os integrantes afinando seus instrumentos, contando histórias e, entre uma nota e outra, eis que surgia Hotel California, sucesso dos anos 70 com a banda The Eagles. A música é executada de forma incidental pela orquestra, e os mais jovens adoram essa parte!
E por falar nisso, Torneze diz que é interessante ver essa interação de gerações. A diferença de idade é enorme, 78 anos entre o membro mais novo e o mais velho do grupo. “O segredo é extrair o que cada um tem de melhor”, explica o maestro. Os mais jovens adoram dar suas “ponteadas”, ou seja, solos de viola; enquanto que os mais antigos mantêm a base de uma forma cadenciada.
Embora a OPVC tenha um repertório composto, em sua maioria, por músicas instrumentais, há momentos em que seis “cantadores” se perfilam para dar voz a determinadas canções. É o caso de Cabocla (Tonico/Tinoco), uma das músicas mais executadas, e o Hino Nacional Brasileiro, de um modo que Estrada e Silva não desaprovariam – todas as notas são requeridas pelo exigente maestro.

Centro de referência
A orquestra está inserida no Instituto São Gonçalo de Estudos Caipiras, na Vila Matilde, próximo à estação do metrô. Mantida por seus próprios integrantes, o local vai além da música. Segundo Rui Torneze, o objetivo é formar um centro de referência da cultura caipira. A bibliografia sobre o assunto não é muito ampla, mas a biblioteca em formação (ainda não disponível para o público) já dispõe de bom acervo para iniciantes no assunto.
A principal atividade da ONG é resgatar o repertório musical da Viola Caipira, pois não existem publicações formais ou informais com as letras e arranjos dos registros fonográficos originais. Tais arranjos variam bastante, passando pelo cururu, toada, rasta-pé, recortado, cateretê, pagode, etc. São oferecidos cursos de Viola Caipira, Violão Popular, Luthiaria (construção de viola e violão) e Culinária Regional.
Por tudo isso, hoje eles são o grupo mais solicitado para eventos que envolvam a música e a cultura caipira. E isso impulsionou a gravação do segundo DVD da orquestra, gravado no teatro Pedro II, em Ribeirão Preto. Toda a renda do show foi revertida para instituições locais. Assim que estiver pronto, poderá ser adquirido na página da orquestra na internet, que já comercializa os trabalhos anteriores.

Entre o popular e o erudito
A sala utilizada pela orquestra para seus ensaios tem as paredes adornadas com as imagens de São Gonçalo (padroeiro dos violeiros), Cornélio Pires (pioneiro da música caipira no Brasil) e Tião Carreiro (símbolo de uma geração). A viola é um instrumento popular, mas a OPVC conseguiu impor um olhar sustenido em relação à sua musicalidade. Como não poderia deixar de ser, a maior parte do repertório se baseia na música de raiz, mas com um toque de erudição único.
Solitária entre tantas violas, a rabeca de Vera Lúcia Carratu dá esse toque especial às execuções. Aliás, Vera é uma das sete mulheres que integram o grupo. A orquestra também conta com o famoso percussionista Escurinho, integrante do Regional de Inezita Barroso no programa “Viola, Minha Viola”, da TV Cultura. Ao lado de Pena Branca, Inezita apadrinhou o instituto quando de sua criação, em 2001.
Torneze lembra momentos inesquecíveis do grupo. Um deles foi quando se apresentaram na Bovespa. “Havia muitos estrangeiros aquele dia: investidores, empresários. Na hora em que começamos a tocar, aquele clima de tensão da bolsa acabou. Todos se acalmaram e fomos muito aplaudidos”, recorda. Numa outra oportunidade, foram convidados para tocar no aniversário do bairro da Freguesia do Ó.
De acordo com o maestro, havia dois grupos de hip hop, e eles se apresentariam logo depois. A maior preocupação era como a música caipira seria recebida pelas pessoas que estavam no local. Para a surpresa de todos, vários “manos” começaram a pedir: “toca essa; toca aquela”. Alguns chegaram a dizer que enquanto a orquestra tocava, eles se lembravam do pai ou do avô. “Foi muito gratificante”, conclui.

Abaixo: Estátua de violeiro adorna entrada do instituto; à esquerda: Orquestra ensaia sob olhar de Tião Carreiro

11 de julho de 2008